terça-feira, 7 de setembro de 2010
O diabo e a política
Pouco adiante, já fora dos muros da aldeia, encontrou o Diabo encostado numa árvore, chapéu de palha cobrindo os seus chifres. Tomava água de coco por um canudinho, na mais completa sombra e água fresca desde que se revoltara contra o senhor, no início dos tempos.
O frade ficou admirado e interpelou o Diabo:
- O que está fazendo aí nesta boa vida? Eu sempre pensei que você estaria lá na aldeia, infernizando a vida dos outros. Tudo de ruim que anda por lá era obra sua – assim eu pensava até agora. Vejo que estava enganado. Você não quer nada com o trabalho. Além de Diabo, você é vagabundo!
Sem pressa, acabando de tomar o seu coco pelo canudinho, o Diabo olhou para o frade com pena:
- Para quê? Trabalho desde o início dos tempos para desgraçar os homens e confesso que ando cansado. Mas não tinha outro jeito. Obrigação é obrigação, sempre procurei dar conta do recado. Mas agora, lá na aldeia, o pessoal resolveu se politizar. É partido pra lá, partido pra cá, todos têm razão, denúncias, inquéritos, invocam a ética, a transparência, é um pega-pra-capar generalizado, eu estava sobrando, não precisavam mais de mim para serem o que são, viverem no inferno em que vivem.
Jogou o coco fora e botou o charuto na boca. Não precisou de fósforo, bastou dar uma baforada e de suas entranhas saiu fogo que acendeu o charuto:
Tem sido assim em todas as aldeias. Quando entra a política eu dou o fora, não precisam mais de mim.
Crônica do romancista e cronista Carlos Heitor Cony, publicado em 29/11/2005 na FolhaOnline.
1 comentários:
O diabo há muito que se foi da minha aldeia, com a chegada dos políticos. Hoje nem Deus nos salva destes últimos!
terça-feira, maio 22, 2012 10:43:00 PMNamastê
Luís
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